Joaquim Almeida não era um homem feio. Não cheirava mal, não se vestia de forma desconcertante, fazia a barba todos os dias e o seu cabelo era sempre cortado na perfeição. No entanto, do seu tom de pele e do local de nascimento não podia fugir. Não que se envergonhasse da sua cor um pouco mais escura que o normal e de ter nascido no Congo, país onde os seus pais trabalhavam aquando da sua vinda ao mundo. Se ele não se envergonhava disso, o pior era mesmo a alcunha que tinha pela aldeia, e para a qual muito contribuíam os dois factores anteriores e o facto de, devido a uma má nutrição na sua infância, ser um pouco mais baixo que o normal. Joaquim Almeida era conhecido como o “Conguito”. Na aldeia a vida corria sempre pelo melhor, até que um dia tudo mudou, ou melhor, mudaram os hábitos alimentares que, por sua vezes, alteraram a vivência normal. O senhor Li Xi Xi, nascido e criado em Xangai, emigrou bastante cedo para Portugal. No entanto, essa viagem custou-lhe os olhos da cara, mais propriamente o olho direito, arrancado pela Máfia Chinesa por incumprimento das obrigações (€) para com eles. Fugindo a esse perigo, o senhor Li Xi Xi viajou pelo interior do país, tendo ido parar à aldeia do nosso Conguito. Chegado à aldeia, onde foi bastante bem recebido, o senhor Xi Xi resolveu a certa altura organizar jantares para todos os habitantes, influência do seu primeiro emprego como cozinheiro num restaurante chinês. E o prato que mais aceitação tinha por parte dos aldeães era o cão no forno com soja. Todos os habitantes adoraram o prato. Depois de alguma renitência para com o facto de estarem a comer cão, lá perderam os preconceitos e foram pedir a receita ao senhor Xi Xi. O resultado foi o que se esperava: todos os cães foram comidos com prazer. Todos, com excepção de alguns… Forçados a arranjar outras formas de alimentação, os aldeães viraram-se para a caça à raposa que, diziam, tinha um sabor maravilhosamente idêntico ao do cão. O Conguito, por seu lado, não concebia a ideia de se alimentar com canídeos. Além disso, a fome que tinha passado na infância tornava-o resistente aos prazeres da gula. O Bóbi, o Jóli, o Sinupi, o Pantufa e o Quinzinho, os cães sobreviventes, eram assim cobiçados por todos os aldeões que, a caminho da floresta para caçar, paravam na casa do Conguito a babar por aqueles repastos canídeos que ali estavam tão perto e, no entanto, tão longe do prato. Cada vez que um aldeão, de caçadeira ao ombro, parava em frente à casa, o Conguito saia prontamente para meter conversa e, por outro lado, para evitar males maiores. A meio da conversa surgia sempre o mesmo lamento por parte do caçador: «ai pá, quem não tem cão caça, Conguito». Daí o nome de “Conguito” foi derivando para “com gato” e chegou aos nossos dias como o ditado que todos conhecemos.